O MAL QUE OS AVÓS FAZEM

Uma mãe me perguntou como resolver o problema com a sogra que, segundo ela, mima demais o netinho, sem causar um terremoto familiar. Confessou que teme que tanta bala, pirulito, presentes e agradinhos estrague o garoto, que ela luta para educar. Lembrei-me da minha própria sogra, que fazia o mesmo com o meu filho mais velho. Recordo que tive preocupação semelhante – mas passou logo que tomei coragem, e com muito jeito, toquei no assunto. Ela, pessoa muito livre consigo própria, muito dona de seu nariz, daquelas que, aonde chegasse tudo passava a girar em torno de sua esfuziante personalidade, nessa hora me olhou séria, olhou de novo e de novo… Quando eu já estava suando (sempre fico tímida diante de personalidades como a dela – solar, espaçosa, vibrante), para minha surpresa, soltou uma grande gargalhada. E nada mais disse. Na visita seguinte, chegou carregada do mesmo jeito… E assim foi até o final da vida. Aos domingos, íamos sempre almoçar com ela. Eram quatro filhos – muitos netos, portanto. Para eles havia uma gaveta enorme, gigante mesmo, na cômoda da sala, cheia de todos os bombons, chocolates, balas e chicletes preferidos de cada um. O cardápio do almoço era escolhido a dedo – só as preferências de cada neto. Era uma correria quando chegávamos; a criançada, antes de qualquer coisa, se precipitava para o gavetão, ansiosa, a ver se a vovó providenciara tudo, como sempre. Ela jamais os decepcionou. Cheguei a me preocupar um pouco com isso como disse, mas depois, observando melhor a relação com meu filho, concluí que esse meu cuidado era uma grande bobagem. Porque o que ela dava não era doce, brinquedo, pirulito – era amor, alegria, bem querer até não mais poder. Juntamente, claro, com muito doce, brinquedo e pirulito… Faleceu cedo. Meu filho, que nem dez anos tinha ainda, passou três dias trancado no quarto inconsolável. Triste. Profundamente. Mas, até hoje, quando desenha ou descreve uma avó, ela sempre aparece gordinha, cheia de peito e de riso, é macia, usa óculos, faz crochê e tricô – e sempre está usando vestidos bem estampados. Enfim, é tal e qual a vovó que lhe ficou na memória e no coração. Então, vendo pais preocupados com os “estragos” que os avós fazem, pergunto: Qual é a avó (ou avô) que realmente faz mal ao neto? Será que a relação de atenção, carinho e estímulo – até mesmo os excessos – não é muito, mas muito mais benéfica do que o suposto mal que causam, deixando que subam de sapatos no sofá? Sempre afirmo que pais seguros de seus objetivos, sobretudo se forem coerentes e persistentes, podem ter certeza de que passarão aos filhos o que é certo e o que não é. Não precisam temer os mimos dos avós, porque o saldo da convivência amorosa, se os “estraga” um pouquinho, em compensação nos devolve uma criança que se sabe imensamente querida. Para que procurar problema em tudo? Pequenas correções de rota que se tenha de fazer depois serão certamente insignificantes frente aos benefícios que essa relação única traz aos netinhos. E, já que aos pais cabe a tarefa desgastante de educar, deixemos aos nossos filhos a paz do refúgio da casa dos avós. Garanto que, se eles acharem que as crianças estão passando dos limites, saberão agir perfeitamente bem. Afinal, não foram eles que nos educaram e nos transformaram nessas maravilhas?
(*) Filósofa, Mestre em Educação, escritora, autora de “Sem Padecer no Paraíso.”

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